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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Pescoço


Os três, Sócrates, Adamastor e Lizandro haviam acabado de correr cinco quilometros. Estavam moídos de cansaço e se apoiaram no guarda-corpo à beira do estuáfio Rio Guaíba para ver enquanto o sol se deitava ao mesmo tempo em que recuperavam o fôlego.
Ali pelas tantas o Lizandro falou:
-Tem coisa melhor do que ver esse pôr-do-sol com uma inundação de endorfina correndo pelas veias?
-Seria melhor não estar com dois marmanjos peludos fedendo a saco suado. - Retrucou o Sócrates.
-Verdade. - Assentiu o Lizandro. -Sentir o cheirinho de uma mulher recém saída do banho seria muito melhor... O cheirinho nos ombros... Ah, os ombros...
-Bom, mesmo - Disse o Adamastor - É braço de mulher. Hmmmmmm... Braço, mesmo, saca? Não antebraço, aquela parte acima do cotovelo, onde existe um pouco mais de carne, ah, meu Deus... Cair de dente ali, não pra machucar, até porque a pele do lado de dentro do braço, ali junto ao corpo, é muito fininha, mas morder ali, mordiscar... Cara...
-E a penugem? Aquela penugenzinha dourada que tem naquela parte do braço? - Perguntou o Sócrates, revirando os olhos.
-Ah, as penugens... Aquela bem levinha, na côxa, tá ligado? Douradinha, os pêlos quase imperceptíveis... - Lembrou o Lizandro.
-E o cheiro? O cheiro natural da pele das côxas da mulher? O que é aquilo? Não é o acinte de um perfume com fixador máximo, não, é um lance suave, doce... É doce, não é? Adocicado... - Perguntou o Adamastor.
-É, é adocicado.
-Pode crer. - Concordaram Sócrates e Lizandro, após pensarem brevemente.
-Deve ser o lance do canibalismo, sentir aquele cheiro no paladar, mas mais forte...- Consecturou o Sócrates.
Suspiraram brevemente. O Lizandro voltou a falar:
-Ah, e a bunda? Bunda não pode faltar, aquele ponto em que a côxa vira nádega? Sabe?
Os dois sabiam, suspiraram.
-Quadris. - Falou simplesmente o Sócrates, sem dizer mais nada, e os outros dois suspiraram de novo.
-Seios. - Disse o Lizandro. Não precisam ser muito grandes, claro, se forem, beleza, mas não precisa. Aquela pele suave, fininha, macia que tem ali... Aquilo, sozinho, não importa o tamanho, já justifica as horas de treino pra aprender a tirar o sutiã de alguém sem olhar...
Os outros dois concordaram.
Ficaram em silêncio vendo o sol sumir nas águas escuras do Guaíba, e o céu ficar púrpura, e então azul-marinho, apenas com um raio lilás no horizonte.
Começaram a se mexer pra ir embora, mas o Adamastor, que continuava apoiado no guarda-corpo falou:
-Bom, mas bom mesmo, mesmo, de verdade, é pescoço. Pescoço é mais do que apenas bom, pescoço é mais do que apenas ótimo. Pescoço conversa. Quando tu beija o pescoço de uma mulher é uma conquista, é intimidade, beijar na boca a gente beija direto, é ótimo, mas o pescoço, pescoço a gente só beija quando as coisas estão redimensionadas. E o barato do pescoço é que ele é uma via de duas mãos, quando tu beija o pescoço de uma mulher, a nuca de uma mulher, significa que tu quer mais do que apenas a intimidade artificial de um beijo nos lábios, significa que tu quer o pacote todo, e se a mulher beija o teu pescoço, meu amigo, ah, aí é porque ela já aceitou o pacote completo com tudo o que tem direito. Beijo no pescoço, meus camaradas, esse sim é o marcador definitivo de afeto de uma relação homem/mulher.
O Lizandro e o Sócrates não disseram nada. Balançaram a cabeça brevemente enquanto olhavam pro infinito. Despediram-se sem muitas palavras, e então foram embora, cada um para sua respectiva casa, todos pensando se já não deviam ter um pescoço feminino pra beijar em casa.

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