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sábado, 4 de fevereiro de 2012

Manobra


Vinham a Thaís e o Fred pela rua, os dois de mãos dadas apesar do calor senegalês que fazia em Porto Alegre naquela semana. O Fred, que odiava o verão com cada fibra do seu ser, tentava manter apenas os dedos entrelaçados, com as palmas das mãos afastadas, era uma tentativa desesperada de manter o ar circulando entre a sua mão e a mão da Thaís de modo a reduzir a temperatura que aumentava conforme caminhavam.
A manobra, porém, não estava funcionando, até porque cada vez que Fred afastava a palma de sua mão da de Thaís, ela se movimentava, também, reaproximando sua mão da dele.
Fred sabia como a Thaís era, ela não era dessas meninas que grudam, que passam o dia todo coladas no sujeito, não.
Na verdade a Thaís era bem o oposto disso, ela era extremamente carinhosa quando estavam juntos, mas não era do tipo que fica estorvando, tocando o tempo todo, alisando ou puxando o rosto do sujeito. Não, ela era uma dessas meninas de toques delicados e de presença e carinho discretos. Qualidades que o Fred admirava sobremaneira em uma mulher.
Mas ali estava o verão. E o Fred era demasiado calorento. Tinha uma ojeriza patológica do calor do verão. Achava o verão uma estação para vagabundos e desocupados.
Agora estava ali, com a mão da Thaís na sua. A palma delicada dela fazendo a sua mão suar em profusão.
Queria pedir licença, mas não queria magoá-la, não queria que ela pensasse que ele não gostava do contato com ela, até porque, se havia uma coisa nos últimos anos da vida de Fred que ele aprendera a admirar fora o contato com Thaís, com sua pele macia, com o seu corpo pequeno, perfumado e delicado.
Mas o calor... Ah, o calor... Fred precisava fazer alguma coisa. Precisava de um pretexto.
Foi quando teve um estalo.
Uma mulher alta, de longas pernas e cabelos loiros muito lisos passava na direção oposta àquela em que seguiam Fred e Thaís. Rebolava o quadril generoso dentro de uma saia de tecido mole que dançava no contato com suas coxas opulentas,e tinha o busto robusto espremido em uma sumária blusa branca.
Fred esperou sorrateiro como um jaguar antes do bote que a loira voluptuosa passasse por ele e Thais, e assim que ela passou, virou o pescoço para acompanhar o rebolado hipnótico da aspirante à dançarina de axé.
Thaís parou de andar e encarou Fred com cara de contrariedade explícita.
-Que falta de vergonha, Fred. De mão comigo e encarando a bunda daquela moça?
Fred gaguejou algo, mas Thaís não lhe deu tempo. Soltou sua mão e continuou andando.
Fred, aliviado, sorriu enquanto a perseguia fingindo tentar se explicar.
Aquele pequeno deslize seria perdoado com facilidade, e certamente não faria Thaís desconfiar do apreço que Fred sentia por ela. Seria interpretado apenas como uma demonstração involuntária de um dos muitos aspectos abjetos do gênero masculino. E Fred ganharia algum tempo para deixar sua mão respirar.

5 comentários:

  1. Não seria mais fácil dizer: "Porra, que calor, minha mão tá suando"?

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    Respostas
    1. Muito mais, mas há coisas que a mente feminina não admite.

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    2. Antes uma mão suando a uma encarada na bunda.
      O que a mente feminina não admite? Eu não admito que olhar pra bunda seja um ato INVOLUNTÁRIO, nato e natural.

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    3. E, cara, tu é machista pra caralho!

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  2. Machista, não. Realista. Não se muda séculos de cultura machista de uma hora pra outra, infelizmente...

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