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sábado, 29 de dezembro de 2012

Resenha Cinema: As Aventuras de Pi


Eu duvido que haja muitas coisas mais sensíveis do que o cinema de Ang Lee. Trata-se de um diretor que coloca drama até onde ele é totalmente desnecessário, como num filme do Hulk ou um longa de kung-fu. É o sujeito que que depois de O Segredo de Brokeback Mountain deve evitar Clint Eastwood nos festivais e provavelmente teria sido surrado por John Wayne se este ainda estivesse vivo, é o cineasta que dirigiu Razão e Sensibilidade e Tempestade de Gelo... Enfim, há poucos cineastas mais sensíveis do que o taiwanês, o que pra mim, que sou um brucutu nato, não é exatamente um elogio...
Ainda assim, desde o primeiro trailer de A Vida de Pi, que depois se tornou As Aventuras de Pi, eu estava curioso pra ver o filme, que ao menos nos trailers, tinha imagens que pareciam emular as viagens visuais pós-morte de Um Olhar do Paraíso (O que não era lá muito alentador, mas ainda assim...).
Filme conferido, posso dizer que jamais a sensibilidade de um cineasta serviu tão bem a um propósito.
As Aventuras de Pi mostra um escritor (Rafe Spall) entrevistando Piscine Molitor (Pi) Patel (Irrfan Khan, tão bem que eu não espero mais que pergunte quem está na nota de mil rupias), um homem que carrega consigo uma história de sobrevivência única.
A família Patel era dona de um zoológico em Pondicherry, na índia, até serem forçados a abandonar o negócio por conta do fim dos incentivos da prefeitura local, e se mudar para o Canadá, onde o pai, Santosh, poderia encontrar novas possibilidades de emprego, e vender os animais, muito mais valiosos na América do Norte. Entretanto, durante a viagem, uma tempestade afunda o cargueiro onde a família Patel viajava, deixando o jovem Pi (Suraj Sharma, ótimo) preso em um bote salva-vidas com uma zebra, a hiena Hari, a orangotango Suco de Laranja, e o temível tigre de bengala Richard Parker, á deriva em meio ao oceano Pacífico.
Conforme a tripulação do bote míngua, Pi cria um laço indestrutível com Richard Parker, que se torna sua razão de viver na viagem incerta que ambos fazem juntos. A relação do jovem com a fera é ao mesmo tempo tensa e tocante, uma faca de dois gumes onde Pi se vê sempre no limiar de se transformar na última refeição de Richard Parker, mas não consegue abdicar de seu único companheiro, que de diversas formas, se torna sua razão de viver.
O texto do longa, repleto de referências religiosas de diversos credos (Pi é um hindu, católico muçulmano que ensina um curso de Cabala na universidade) consegue ser pio sem ser panfletário, e sensível sem ser frouxo. Ang Lee ainda esbanja estilo ao usar o que há de mais moderno em termos de tecnologia para criar um oceano infinito que consegue ser tão assustador quando se encrespa violento durante gloriosas tempestades de raios quanto é quando fica liso como um espelho, refletindo o dourado do sol ou as estrelas noturnas num 3D comparável apenas ao de Hugo Cabret, em termos de qualidade e o de Avatar em termos de arrebatamento visual.
Os animais são outro capítulo à parte. Richard Parker em especial. O tigre de bengala digital criado à perfeição para o filme gera medo e ternura na mesma medida, e nós nos flagramos tão preocupados com ele quanto estamos com Pi.
Pelmas para Ang Lee, que conseguiu criar um monstruoso (no bom sentido) espetáculo visual para ser visto e revisto em tela grande, com som digital, sem esquecer de adicionar delicadeza à mistura na forma de um elenco afinado e bem dirigido, criando um épico glorioso que traz lágrimas aos olhos e leveza ao coração.
Um dos melhores de um ano cheio até o gargalo de ótimos filmes. Obrigatório pra todas as formas de vida baseadas em carbono que são capazes de entender cinema.

"Acho que no fim, a vida inteira se torna um ato de desapego, mas o que sempre fere mais, é não ter um momento para dizer adeus."

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