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segunda-feira, 2 de julho de 2018

Resenha DVD: O Passageiro


E Liam Neeson segue com seu obstinado caminho de herói de ação sessentão em mais um longa de sua parceria com o diretor espanhol Jaume Collet-Serra que chega ao seu quarto filme (os outros são Desconhecido, Sem Escalas o ótimo Noite Sem Fim).
A senda de filmes de porradaria do ator irlandês que herdou de Harrison Ford o posto de "homem querendo sua família de volta número 1 de Hollywood", iniciada em 2009 com o insuspeito sucesso Busca Implacável (que conta com uma das melhores falas de um filme em todos os tempos, o discurso "eu vou encontrá-lo".) é bastante irregular quando olhamos com alguma parcimônia.
Rendeu tanto filmes ótimos como A Perseguição e Caçada Mortal, quanto porcarias como Sem Escalas e Busca Implacável 3, mas ei, é a carreira do homem. Dramas profundos como Silêncio e Os Miseráveis não devem pagar as contas, então, não há anda de errado em passar algumas semanas fingindo que está matando meliante com mãozada na cara, especialmente quando isso, além de pagar o leite das crianças, rende alguns bons frutos.
Este O Passageiro conta a história de Michael McCauley (Neeson), um ex-policial que após anos na força se demitiu e virou vendedor de seguros. Michael tem uma esposa, Karen (Elizabeth McGovern, de Downton Abbey), um filho prestes a entrar na faculdade, uma casa em Westchester e uma rotina terrivelmente repetitiva com a qual, aos sessenta anos, ele parece bastante confortável.
Michael parece alguém sem muitas surpresas que esperar do futuro até a manhã em que é despedido às vésperas da entrada de seu filho na universidade. Com duas hipotecas na casa que é seu único patrimônio, e prestes a se aposentar, Michael é capaz de apreciar o tamanho da tragédia financeira que se abateu sobre ele e sua família com a súbita demissão.
Após chorar as mágoas no bar onde se encontra habitualmente com seu ex-parceiro, Alex Murphy (não o Robocop, mas o Coruja de Watchmen, Patrick Wilson), Michael resolve voltar para casa matutando como contar à Karen que perdeu o emprego. Ele chega à estação Grand Central em Manhattan e pega o trem que tem pegado nos últimos dez anos de volta pra casa, mas, como desgraça pouca é bobagem, seu celular é roubado na estação, e não há ar-condicionado em todos os vagões.
Após cumprimentar seus colegas de trem habituais, Michael é abordado pela misteriosa Joanna (Vera Farmiga), que se apresenta como uma estudiosa do comportamento humano, e oferece a Liam Neeson uma chance de ganhar cem mil dólares em troca de um pequeno favor:
Ele deve encontrar uma pessoa no trem, uma pessoa que não é um passageiro habitual, está carregando uma bolsa e descerá em algumas estações. Ao encontrar o tal passageiro, Michael deve colocar um dispositivo de rastreio GPS na bolsa dessa pessoa e pronto. Tudo estará resolvido, incluindo os problemas financeiros imediatos de Michael, sua hipoteca e a faculdade do filho.
Se o mote do filme se apresenta como um daqueles dilemas morais que nos fazem ficar na ponta da cadeira roendo as unhas e pensando no que faríamos no lugar do protagonista, há que se deixar claro que isso só funciona quando o espectador acredita que o protagonista condenará um desconhecido à morte em troca de grana.
Por mais que Liam Neeson se esforce (tanto quanto o roteiro permite) para vender a tentação de Michael McCauley tanto com seus problemas financeiros quanto com seu orgulho de macho alfa-provedor, a verdade é que nem por dois minutos nós acreditamos que o herói do filme vá entrar nessa.
O fato de o protagonista ser excessivamente decente e macho para se tornar uma vítima crível rouba do filme suas óbvias aspirações Hitchcockianas. Liam Neeson não fugiria feito um desgraçado igual a Cary Grant em Intriga Internacional. Ele simplesmente mataria Vandamn e Leonard em confronto singular e iria pra casa.
Com isso, a despeito do caleidoscópio de personalidades com os quais Michael convive no trem, e a aspiração de tornar o longa mais politicamente relevante com a frequente inclusão de menções à crise imobiliária dos EUA e de como os banqueiros de Wall Street enriqueceram enquanto a classe média era vilipendiada de seus bens, O Passageiro jamais consegue ser mais do que um filme de ação em espaço restrito.
Jaume Collet-Serra e os roteiristas Byron Willinger, Phillip de Blasi e Ryan Engle não conseguem cobrir a distância que faria o longa ser vagamente memorável, mantendo-o como nada além de uma razoável sessão de entretenimento de uma hora e quarenta minutos que nós podemos
apreciar especialmente por conta do carisma de seu protagonista, que continua sendo o tipo de tiozão bruto capaz de divertir enquanto cai na porrada com a marginália rasteira de Hollywood, e quase nada mais.
A despeito de alguns nomes respeitáveis no elenco de apoio (tais quais Jonathan Banks e Sam Neill), O Passageiro é um produto descartável, e sem o nome de Liam Neeson em cima do título, seria um thriller de ação genérico pra figurar nas madrugadas da Globo. Com Liam, pode valer uma espiada na TV a cabo, ou uma locação na falta de opções melhores na locadora.

"-Que tipo de pessoa você é?"

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