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quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Dia infernal


Tem dias em que nada dá certo. São dias em que parece que, se há o tal do equilíbrio cármico, o teu está desregulado, é a única explicação, ou é carma desregulado ou então em alguma encarnação anterior tu foi Pizarro, ou Mussolini. Enfim, isso serve apenas para quem acredita em reencarnação, bobagem, claro. Tu sabe que, depois de passar uma vida inteira na terra e conhecer esses dias em que nada dá certo, ninguém, em sã consciência, iria querer voltar, certo?
Não há nenhuma razão. Nem pra reencarnação, nem pra vida após a morte (A gente trabalha, se esforça, luta, se esfalfa inteiro, sofre com desapontamentos pra, depois, ainda ter uma segunda vida pela frente? E ainda eterna? Credo!).
Enfim, são esses dias em que tu tem a nítida impressão de que, se tivesse seguido seus instintos e ficado na cama, teu apartamento teria pegado fogo e tu nem sequer teria morrido queimado, teria tido quarenta e dois por cento do corpo coberto por queimaduras de segundo grau e sobrevivido apenas pra sofrer mais por um período mais longo.
São dias em que a gente acorda atrasado pro trabalho. Com aquela dor de cabeça persistente localizada bem em cima do olho direito, por baixo da pálpebra, sabe? Aqueles dias em que nada dá certo, em que tu decobre que só pode sacar o abono do PIS-PASEP se tiver um cartão do cidadão, em que tu decide sair de camiseta branca e imprudentemente acha que pode comer um cachorro quente de carrocinha no almoço, ou beber uma Fanta, e a tragédia se instaura porque tu, como se tivesse seis anos de idade, se suja comendo. E aí passa o resto do dia com a camiseta manchada, trabalhando fantasiado de porquinho, ou sai em desespero e tenta achar um lugar perto do trabalho pra comprar uma camiseta básica limpa.
São aqueles dias em que um cliente extremamente chato aparece na loja onde tu trabalha querendo trocar um sapato que comprou exatamente oitenta e nove dias atrás e que tu não tem mais em estoque, em que a mãe de um aluno porra-louca acha que tem colegas que são má influência pro moleque, quando, na verdade, ele é má influência pro mundo em geral, em que o teu chefe tem uma epifania no meio da madrugada e acha que hoje é um bom dia pra repaginar todo o funcionamento da empresa á despeito de tu estar com mais da metade do balanço de final de ano encaminhado.
São dias em que a tua tia te liga pedindo ajuda pra formatar o computador, e tu, a despeito de saber quase nada de informática e estar louco por um banho e um filme, se vê na obrigação de ajudar por ela, afinal de contas, entender nada de fato.
Dias em que o rangido do pé esquerdo do teu tênis se torna mais irritante que o de costume. Dias em que tu vê tanta gente besta e ruim fazendo tanta coisa besta e ruim que te pergunta se o D-Fens Foster não estava com a razão, afinal de contas.
São dias em que tu gostaria de falar sobre futebol com teu avô, mas ele não está mais lá. Dias em que tu queria ir à praia e ficar dentro do mar até os dedos murcharem, mas as obrigações não permitem. Dias em que tu compreende por que as pessoas precisam acreditar em religião e nas recompensas além-vida e nas segundas chances, mas ainda assim, essas coisas continuam forçando o teu discernimento além da conta. Dias em que tu quer abraçar alguém, beijar alguém, ter o colo de alguém onde apoiar a cabeça, mas está irremediavelmente sozinho. Em que tu te pergunta qual é o ponto de tudo isso. Em que tu te interroga pra que toda essa porcaria... E encontra a resposta nela. No seu amálgama adorável de texturas, cores, cheiros e sabores, quando ela sorri, ou melhor ainda, quando ri após falar uma bobagem. Quando ela te desarma e te deixa ainda mais inseguro que o habitual, e tu te esforça pra endireitar a postura, e não resiste a tocar o pescoço dela quando vão atravessar a rua... Aí tu percebe o ponto:
Mesmo esses dias miseráveis trazem a sua recompensa.

3 comentários:

  1. Vixe, a macaca tá solta por ai também ?

    É, ainda bem que tem esse fator recompensa, é o que impede tu de dar um telefone pra Magneto e dizer : - Bicho, tu tava certo. Dá pra vir acabar com tudo o mais rápido possível ??

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  2. Eheheheh, o pior, Laís, é que, independente das eventuais pequenas recompensas da vida, na maior parte do tempo, eu ainda acho que o Magneto tem razão...

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  3. hahahaha ah tá, é que pelo jeito que você disse parecia que a ''recompensa'' fazia Magneto não estar certo sobre a extinção da raça humana. Mas já que não, faz favor de avisá-lo que ele pode vir, pra ontem, dar um jeito nessa porcaria toda...

    * pior.... comer um hot dog , tomar uma fanta e se sujar, é proeza demais, é conspiração cósmica demais, é pedir pra ser exterminado...eu que o diga...

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