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segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Auto Piedade, ou Musical Particular.


A humanidade tem uma forte tendência á auto comiseração, mais forte do que a nossa capacidade de solidariedade, provavelmente por que é muito mais fácil sentir pena de si mesmo do que de outrem, não precisamos nos esforçar para colocar-nos em nosso próprio lugar, e assim, quando nos elencamos no papel de vítima, economizamos em empatia.
A maioria de nós passa pela infância colhendo as benesses do papel de vítima. Um pequeno resfriado, que rende paparicos e mimos que a saúde plena não oferece, o gesso no braço, que nos desobriga de certos deveres, o papel de rebelde injustiçado que á todos cai bem. Sentimos pena de nós mesmos por que é fácil. Ser vítima é cômodo, não requer grande prática, pois trata-se de uma habilidade inata, cultivada desde o berço, quando percebemos que seremos alimentados após derramar lágrimas. Viver sob o estigma de coitadinho é um talento funesto para o qual todos estamos equipados, encontrar o momento de abandonar esse papel, por outro lado, pode ser mais difícil, mas sem dúvida é mais recompensador.
Todos nos deparamos com momentos de definição na vida, eles podem não ser adornados com luzes, dança ou aplausos como um filme da Disney, podem ser momentos íntimos dos quais ninguém jamais venha á saber, ou podem ter inúmeras testemunhas incapazes de entender o peso daquele instante para seu protagonista. Esse momento de definição, esse instante mágico em que somos obrigados á decidir se permaneceremos sentindo pena de nós mesmos ou se piedade não mais nos satisfaz é difícil, ele requer, acima de tudo, compreenssão e entendimento. Ele pode ser confundido com um momento comum, apenas outro, e, se o deixamos passar, pode levar anos até que outro surja, isso, se surgir.
Para as pessoas que deparam-se com esse momento e têm a clareza para percebê-lo, aproveitá-lo e comprometer-se com ele, a recompensa é imensurável. A paz de espírito de uma pessoa que diante de uma injustiça, de uma injúria, ou de um desafio preferiu rilhar os dentes, cerrar os punhos e não se colocar como uma vítima diante da vida, e sim como alguém disposto á encarar o mundo e o que quer ele tenha á oferecer, seja bom ou ruim, não tem preço. Pode ser o ato de se erguer e assumir um erro, de mesmo com lágrimas nos olhos e terror no coração, impedir alguém mais forte de ferir á quem se ama, abandonar o medo e o manto de vítima e abraçar a própria força. Esses são frutos amargos de plantar, mas doces de colher, e seu sabor permanece conosco, e nos momentos mais difíceis, a lembrança de sua doçura nos dá impulso, nos afasta do caminho fácil do flagelo auto imposto e nos guia pelas veredas da coragem.
Parar de sentir pena de si mesmo é mandar a covardia lá pra casa do Capita. É abraçar a coragem em detrimento do medo, a sabedoria em detrimento da ignorância, a vida em detrimento da morte.
É trabalhoso, no início pode ser incômodo, desagradável ou até aterrador, mas mesmo nesses casos, a sensação de completude decorrente de enfrentar as mazelas da vida, de abandonar a auto piedade é tão maior e mais profunda que o incômodo o desagrado e até mesmo o terror, que vale todo o esforço.
E se, algum tempo depois de abandonar esse sentimento mesquinho que é a auto-piedade, você sentir um sabor doce na boca ao relembrar o momento, se sentir iluminado, e ouvir, ainda que apenas em sua mente, aplausos, pode até, arriscar um passo de dança.

"Renegue o medo."

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