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segunda-feira, 19 de junho de 2017

Resenha Blu-Ray: A Grande Muralha


Eu vou confessar que, pelos trailers, A Grande Muralha me pareceu um daqueles esforços multi-nacionais para fazer um filme onde a China aparecesse bem, mais ou menos ao estilo do bom Karatê Kid com Jaden Smith e Jackie Chan. Um grande cartão postal da China com elenco majoritariamente local e uma ou duas estrelas ocidentais pra aumentar o interesse do público de olhos redondos.
Por mais que eu tenha sido um dos que gostaram de Karatê Kid com Chan e Smith, eu preciso dizer que um filme que me atinge mais como estratégia de mercado do que como vontade de contar uma história imediatamente se torna meio antipático pra mim, e essa foi uma das principais razões pra eu ter deixado pra ver A Grande Muralha no conforto de um domingo chuvoso em casa, e não no cinema, quando o filme estreou em fevereiro desse ano.
Ainda assim, as prévias e o nome de Zhang Yimou na direção mostravam que, por mais que se quisesse falar mal do filme antes de vê-lo, a produção não deixava a desejar no tocante à parte técnica da coisa, especialmente na direção de arte, que Yimou, de Herói e O Clã das Adagas Voadoras já deixou bem claro, domina com maestria de pintor impressionista.
Então ontem, enquanto a temperatura despencava de 26 para dez graus conforme a chuva avançava sobre Porto Alegre, liguei o Blu-Ray e fui conferir o filme.
Na trama conhecemos William (Matt Damon), um mercenário (talvez) britânico, veterano de muitas guerras na Europa, que agora vaga pelo território oriental tentando encontrar uma forma de ter acesso ao pó negro de fogo, uma arma cuja existência se tornou lendária na Europa, e que pode render uma fortuna a quem for capaz de retirá-la da China e levá-la ao velho mundo.
Após se esconderem em uma caverna para acampar, os quatro homens são reduzidos a apenas dois quando, em meio à madrugada, uma criatura não-identificada ataca o acampamento.
William consegue abater o monstro, e ele e seu companheiro Pero Tovar (Pedro Pascal, o Oberyn Martell de Game of Thrones), seguem viagem, carregando consigo a mão decepada para tentar descobrir suas origens.
Seguindo viagem, os dois ocidentais acabam esbarrando com um dos quadrantes da Grande Muralha da China, onde são recebidos com uma saraivada de flechas do exército conhecido como Ordem Sem Nome.
Capturados, os dois mercenários mentem sobre suas intenções na China, dizendo que são comerciantes em busca de negócios, e têm seus pertences revistados, revelando o braço arrancado da criatura noturna.
Inicialmente os soldados não acreditam que William tenha eliminado o monstro sozinho, mas o Estrategista Wang (Andy Lau) não vê motivos para duvidar, já que as evidências corroboram a versão apresentada por William.
Enquanto o comando da ordem discute qual deve ser o destino dos dois, ressoa um alerta, avisando que o inimigo se aproxima.
William e Tovar são levados à muralha onde acompanham, estarrecidos, a luta que se desenrola, entre a Ordem Sem Nome e medonhas criaturas dracônicas a quem os nativos chamam de Tei Tao. Em meio ao combate, William e Tovar se libertam, e entram na batalha junto aos soldados, ajudando a rechaçar o ataque e ganhando o respeito de seus captores, que os tornam hóspedes ao invés de prisioneiros.
Eles, então, conhecem a comandante Lin Mae (Tian Jing, que parece arrancada de um jogo de videogame), o general Shao (Hanyu Zhang), e Ballard (Willem Dafoe), outro ocidental que, a exemplo de William e Tovar, viajou à China em busca de pólvora, mas falhou em seu intento e está há vinte e cinco anos preso na muralha. Nesse tempo, ele aprendeu chinês e ensinou alguns dos oficiais a falar inglês e latim, tornando-se um hóspede involuntário da Ordem Sem Nome.
É com a ajuda dele que William e Tovar ficam sabendo que os Tei Tao chegaram à China em um meteoro quase dois mil anos antes, e de seis em seis décadas, empreendem um novo ataque, matam dezenas de guerreiros, os devoram, e alimentam sua rainha, que se reproduz trazendo mais e mais Tei Tao ao mundo.
Se as criaturas chegarem à China, e se alimentarem dos milhões de pessoas que vivem lá, se reproduzirão em um ritmo tão inacreditável que serão capazes de consumir toda a humanidade, para impedir isso, o império ergueu a Muralha, e formou a ordem sem nome, a mais impressionante, disciplinada e hábil força de combate da China, que existe com o único propósito de deter os monstros.
Por sua bravura e habilidade, Tovar e William são convidados a se juntar à Ordem, um convite que pode ser a oportunidade perfeita para sair da China com o pó negro, especialmente se contarem com a ajuda de Ballard, que conhece os hábitos e a língua locais.
Mas será que William, que tem passado toda a sua vida lutando por lucro, será capaz de virar as costas à primeira guerra que verdadeiramente vale a pena lutar?
A Grande Muralha não é um filme ruim.
O longa tem uma premissa interessante, misturando elementos caros ao cinemão norte-americano, como o estrangeiro seduzido por um estilo de vida totalmente novo que o encanta, e ao cinemão chinês, nominalmente a disciplina de lutar abrindo mão de todo o egoísmo em nome do bem comum. Os dois motes se encontram de maneira acertada em A Grande Muralha, com o personagem de Damon fazendo as vezes do capitão Nathan Algreen de Tom Cruise em O Último Samurai, ou o personagem de Sam Worthington em Avatar, ou de Richard Harrison em Um Homem Chamado Cavalo, e precisando abrir mão do egoísmo e da desconfiança que o têm mantido vivo ao longo dos últimos anos para se integrar à uma cultura que o encanta e assombra.
Yimou faz um ótimo trabalho ao gerar motivo para encanto e assombro com sua produção de arte de cair o queixo. Cada armadura em tons de dourado, vermelho, preto, roxo ou azul, cada armamento farpado brandido com estilo e graça, cada guerreira que salta pendurada em cabos... Tudo ajuda a apresentar o longa de maneira sólida em seu primeiro ato, mas ele começa a claudicar a partir do segundo.
A grande quantidade de roteiristas envolvidos no script, algo que nunca é um bom sinal, pode ser culpada pela quebra de ritmo do filme a partir do momento em que o personagem de Damon resolve ficar ao lado da Ordem Sem Nome e enfrentar os Tei Tao.
A história começa a dar pequenos pulos, e os personagens passam a se mover em ritmo acelerado porque, aparentemente, o estúdio queria o filme com menos de duas horas (o longa tem uma hora e quarenta e três minutos que passam voando).
Exemplo disso é a invasão dos monstros ao território chinês. À certa altura somos informados de que os monstros conseguiram passar pela muralha.
Não há nenhuma pista de como as criaturas conseguiram fazer isso, nenhuma explicação, e nós nem sequer vemos isso acontecer, apenas somos informados.
A trama precisava desse evento, e então ele foi enfiado no filme de maneira atabalhoada, e nem mesmo o fato de entre o time de roteiristas haver nomes como Edward Zwick e Tony Gilroy (além de Max Brooks, Marshall Herskovitz, Doug Miro e Carlo Bernard) consegue esconder o fato de que o filme passa a correr pro seu desfecho a partir da metade, o que é uma pena.
O elenco é bom e numeroso, há uma história divertida impulsionando o filme, e uma sutileza oriental emana da direção de Zhang Yimou, além da direção de arte embasbacante em cada detalhe tão afeita ao trabalho do diretor, que contrabalanceia o espetáculo de CGI da invasão alienígena que fede a pipoca.
A Grande Muralha não é, nem de longe, tudo o que poderia ser. Mas não é mau filme.
Numa tarde chuvosa de domingo, ele preencheu com graça a tela da minha TV, e me distraiu. Se não valeu uma visita ao cinema, certamente vale a locação.

"-Olhe para esse exército... Você já viu algo assim?
-É incrível."



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