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quinta-feira, 1 de junho de 2017

Crueldade


Dói no meio do meu peito. Todos os pelos do meu corpo se eriçam e eu pareço ter sido atingido por um aumento exponencial da minha audição e tato enquanto a minha visão fica turva e meus cotovelos adormecem e eu cerro os dentes até eles quase rangerem...
É sempre assim.
Todas essas coisas acontecem ao mesmo tempo quando eu tomo conhecimento de algum ato de crueldade.
A fúria que me toma é tanta que eu não posso deixar de imaginar como seria se eu, alguma vez, visse algo horrível acontecendo ao vivo, in loco.
Não posso, infelizmente, refutar a ideia de que eu fosse simplesmente congelar. Já me aconteceu em outras situações, de simplesmente travar, como se tivesse sofrido alguma espécie de bug cerebral e fosse incapaz de ir além do registro. Mas isso foi quando eu era jovem, e em situações em que eu estava assustado, e não furioso.
Quando confrontado com a extensão da crueldade que o ser-humano é capaz de perpetrar, eu não sou tomado de medo, mas de ira. Eu me enojo ante a completa falta de consideração que essa raça vil nutre uns pelos outros e pelas outras criaturas que têm o azar de partilhar esse planeta conosco.
Eu não tenho rede social. Uma das razões é tentar passar ao largo daqueles vídeos que sempre são compartilhados no Facebook e afins que mostram gente sendo cruel com gatos ou cães, imolando gado, escalpelando marsupiais vivos... E ainda assim, tais coisas inevitavelmente chegam a mim, por mais que eu não queira e tente não ver, eu sempre acabo exposto a isso e a vontade que eu tenho de esmigalhar o crânio de quem comete tais atrocidades é tamanha que os nós dos meus dedos ficam brancos conforme eu cerro os punhos imaginando a satisfação que eu teria em surrar um desgraçado...
E então eu me dou conta, de quê, se me fosse dada a oportunidade, eu, que não sou partidário consciente da lei de Talião, seria, também, cruel.
Eu não seria capaz de perdoar, nem de tentar reformar... Eu seria um pérfido castigador.
E então me ocorre que a violência e a sede de sangue devem ser fatores comuns a toda a nossa espécie.
A crueldade é o que nos torna humanos.
E por mais que tentemos negar nossos instintos, em algum momento chegamos à fronteira onde nossa humanidade se revela, e nós somos capazes de grande maldade.
Ou de pequena maldade... Mas maldade.
Porque impôr sofrimento a outro ser vivo é sempre perverso. Não importa se seja algo horrível como decepar as pernas de uma vaca e deixá-la viva em um pasto, ou arrancar a barbatana de um tubarão e jogá-lo de volta ao mar, ou dizer palavras torpes a alguém com a intenção de magoá-lo.
E infelizmente é isso o que nos torna humanos. Não o telescópio espacial Hubble. Não a Quinta Sinfonia de Beethoven. Não a Ilíada de Homero.
Esses são os pontos fora da curva.
Os pontos altos.
Nossa média enquanto espécie é muito, muito, inferior, infinitamente inferior.
E o único alento ao qual me dou o direito, é saber que uma espécie tão empenhada em destruir, eventualmente vai ter sucesso em sua empreitada, e deixará de existir.

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