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segunda-feira, 7 de maio de 2012

Jogo Rápido


O Manoel e a Fernanda estavam sentados no restaurante. Haviam acabado de jantar, ela havia comido ravióli de moranga, que o Manoel detestava, e ele comera, pra irritação dela, um filé com fritas, que ela achava o fim da picada comer filé com fritas em um restaurante como aquele, com um cardápio vasto e repleto de boas opções, mas ele era um sujeito simples, de simples aspirações, e ela, apesar de achar que ele podia aspirar um pouquinho mais, pelo menos quando eles comiam naquele restaurante, o amava assim mesmo.
Eles já haviam jantado, e estavam esperando a sobremesa. Ela havia pedido sagu. Ele achava o fim da picada pedir sagu em restaurante. Geralmente tem sagu em buffet livre daqueles em que se almoça durante a semana e o sagu fica ali, juntando mosca entre o pudim de leite e a torta de bolacha, mas ela gostava, e o que é de gosto é regalo da vida, ele sempre dizia. Ele havia pedido uma torta de sorvete daquelas bem afrescalhadas que são hiper mega caras e deliciosíssimas. Estavam ali, olhando pro infinito e antecipando o sagu com creme e a torta de sorvete quando o Manoel viu, na mesa vizinha, a moça e o rapaz se levantarem. Ele a ajudou a colocar o casaco, e, assim que ajeitou os ombros na peça, ela disse:
-Vou no banheiro, tá, amor? Te encontro ali na frente.
E o beijou. Não um selinho. Um beijo, beijo mesmo, lábios colados, cabeça virada pro lado, movimentos com queixo e todos os músculos da face, tudo conforme mandava o figurino.
O Manoel viu quando o sujeito desgrudou os lábios dos da moça e saiu em direção à saída sorrindo enquanto sua acompanhante se dirigia ao toilette.
Manoel levou uma fração de segundo absorvendo aquilo. Veja você... O casal dera um beijo de despedida enquanto ela ia ao banheiro...
Ao banheiro!
Quanto tempo ela levaria lá? Era um banheiro de restaurante. Era muito improvável que ela fosse lá fazer qualquer coisa que não fosse retocar a maquiagem ou fazer xixi. Coisa de quê? Cinco minutos? Dez no máximo? E eles trocaram um beijo. Beijo, mesmo, não selinho. Beijo de verdade, com direito a suspiro durante e resfolegadoiro depois... O que será que eles faziam de manhã, quando saíam pra trabalhar? Ou o que eles fariam na eventualidade de um deles ter que viajar?
Pensava nisso quando ela saiu do banheiro. Manoel ainda olhou no relógio. Pouco mais de três minutos. Esse fora o tempo em que aquela moça ficara apartada do rapaz que a acompanhava.
Achou bonito. Achou bacana os dois sentirem falta um do outro naquela proporção. De precisar se despedir formalmente para uma ausência de três minutos. Cinco, adicionando o tempo de "viagem" do banheiro à saída do restaurante.
Chegou sua torta de sorvete e o sagu da Fernanda. Comeram sem falar nada. Quando terminaram Manoel pediu a conta, Fernanda quis dividir, ele insistiu em pagar, e ela acabou, após uma breve cena, assentindo. Com a conta paga, ele se levantou e segurou o casaco dela para que ela vestisse. Uma vez encasacada, Manoel colocou a mão nas costas dela para sair, mas ela o interrompeu:
-Peraí, vai indo que eu vou ao banheiro.
Ele, iluminado, inclinou-se pra frente com um bico montado para um beijo. Nem precisava ser beijo, beijo, mesmo, com suspiros e resfolegadoiros, ele se contentava com um beijinho, um selinho estalado que fosse. Inclinou-se pra frente, e Fernanda inclinou-se pra trás:
-Quié isso, Manu? Tá bobo?
Ele protestou:
-Mas eu só quero um beijinho.
Não - Ela replicou. -Eu tô com bafo de comida e sobremesa. Além do mais só vou fazer xixi, não seja fiasquento.
E saiu, serelepe em direção ao banheiro, deixando atrás de si um homem repleto de dúvidas sobre o amor.

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