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quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Resenha Série: Better Call Saul, temporada 4, episódio 9: Wiedersehen


Não há, eu repito, maus episódios em Better Call Saul, e Wiedersehen não é exceção à essa regra. A série viu o a urgência diminuir drasticamente nesse capítulo, é verdade, mas parece tê-lo feito para afastar o tumulto de modo a oferecer à audiência um vislumbre mais aprofundado do que está acontecendo internamente com esses personagens.
A abertura do episódio, com Kim e Jimmy usando as técnicas mais rasteiras para burlar o sistema da cidade de Lubbock de forma a aumentar discretamente o tamanho das salas da agência do Mesa Verde na cidade deixou claro que o casal está em profunda sintonia no que tange à utilização de táticas rasteiras na busca por seus objetivos sejam quais forem. Claro, Kim fala a respeito de usar seus "poderes para o bem", mas enganar uma pobre funcionaria pública de Lubbock para aumentar os escritórios de um banco é o "bem"?
Seja como for, Jimmy deixa estar. Ele parece ter percebido que fisgou Kim de volta, e não vê necessidade de começar a recolher a linha, ainda. Ele está prestes a recuperar a sua licença para praticar direito e cheio de planos.
Enquanto isso, Eduardo Salamanca surge nos oferecendo a origem da sineta de don Hector. Eu não imagino que eu fosse o único fã de Breaking Bad que jamais se perguntou de onde aquela sineta tinha vindo, mas, devo admitir, a imagem de Lalo atando o objeto à cadeira de rodas de Hector sob o olhar justificadamente tenso de Nacho foi muito boa.
Nacho, por sinal, está cada vez mais profundamente atolado na lama, e eu começo a me perguntar se ele não devia ter fugido na semana passada. Agora ele é o cicerone de Lalo Salamanca em Albuquerque e se vê entre Lalo e Gus Fring no que promete ser uma queda de braço complicada para o dono dos Pollos Hermanos. Os outros Salamancas que havíamos conhecido eram capangas brutos, traficantes truculentos, ou apenas sujeitos completamente loucos. Eduardo não é assim. Ele é charmoso, paciente e esperto, mas, aparentemente, tão cruel quanto seu tio e primos, o que o torna uma pedra bem grande no sapato de Gus pela expressão em seu rosto na despedida, e um candidato forte ao papel de maior antagonista da série nas temporadas vindouras.
A ponta de Mike na história deu aquele drible estilo la boba na audiência. A gente sabia que vinha, e ainda assim, caímos.
Após Kai ser mostrado como o sujeito-problemático na equipe de Werner, o cara em quem Mike deveria ficar de olho, foi o engenheiro que acabou escorregando no tomate e deixando Mike em um dilema bastante preocupante.
Por mais que a construção do laboratório secreto tenha a maior cara de filler, apenas uma forma de manter Mike ocupado e no elenco do programa, já que é a história de Jimmy que move a série, toda a coisa é um ótimo filler e tem oferecido alguns dos momentos mais tensos da série recentemente.
Toda a sequência de eventos, com Werner indo ao subsolo checar os detonadores da rocha que devia ser explodida, até Mike negando tão gentilmente quanto lhe é possível o pedido do engenheiro para viajar à Alemanha para ver a esposa até a expressão no rosto do ex-policial quando percebeu o que Werner havia feito foi brilhantemente executada, e sim. Agora eu não tenho nenhuma dúvida de que o destino de Werner, seja qual for, será o evento catalisador que transformará o Mike de Better Call Saul no Mike de Breaking Bad, ou, no mínimo, o colocará inexoravelmente nesse caminho.
E, finalmente, Jimmy foi até a Ordem dos Advogados para recuperar sua licença apenas para ver seu pedido... Negado.
Better Call Saul é frequentemente acusada de ser uma série lenta em termos de ritmo. Não é incomum que eu veja comentários em fóruns perguntando "como as pessoas gostam de um programa onde não acontece nada?". Bem, acontece muita coisa em Better Call Saul, e os roteiristas e produtores não se furtam do direito de meticulosamente criar os meios para que a audiência que não está esperando uma explosão (literal ou figurada) em cada episódio seja capaz de acompanhar cada passo dos processos que levam os personagens de A até B, seja procurando soluções para seus problemas, aplicando golpes ou sendo absorvidos pelas partes mais sombrias de sua própria personalidade.
É essa meticulosidade que permite a cada um de nós tanto sentir a fúria de Jimmy quando seu pedido é negado, quanto entender por que a junta julgadora decidiu não devolver sua licença.
Durante todo o processo Jimmy seguiu cada uma das regras. Ele fez tudo o que havia lhe sido pedido e aguardou pacientemente por um ano até ter a chance de recuperar sua profissão. Claro, ele seguiu montando seus esquemas, de moralmente reprováveis até plenamente criminosos, mas manteve um emprego fixo, apresentou-se na condicional e manteve-se informado a respeito do direito, tudo conforme mandava o figurino.
Na hora de dar suas declarações, Jimmy foi eloquente e apaixonado como é do seu feitio, com ótimas respostas a todas as perguntas que ele sabia que lhe seriam feitas, mas na hora em que uma das associadas lhe perguntou o que a lei significava para ele, Jimmy travou. E ele travou porque todos nós sabemos que a lei não significa nada para Jimmy.
Ele dançou, sapateou e improvisou ao redor do tema porque ele é incapaz de dar uma resposta direta para essa pergunta. E isso, mais o fato de ele se manter incapaz de se comprometer emocionalmente com a morte de Chuck, um renomado advogado do Novo México e um pivô da perda de sua licença um ano antes que ele se recusa a sequer mencionar quando lhe perguntam se ele tem um modelo na profissão, é o que faz com que seu pedido seja negado.
Toda a frustração, tristeza e raiva de Jimmy explodem, e, como ele não tem mais ninguém com quem explodir exceto Kim, é ela que se torna o alvo de sua ira exatamente no momento em que aponta o fato de ele não querer lidar com a perda do irmão, e nós seguimos sem saber exatamente por que. É ressentimento, pelo último ato de Chuck em vida ter sido tentar tomar seu emprego? Frustração por jamais ter sido capaz de provar a Chuck que é um baita advogado?Ou por saber que jamais será um advogado tão bom quanto Chuck porque, simplesmente não nutre a mesma reverência pela lei?
Seja como for, Kim se torna o alvo de todos os sentimentos que Jimmy vinha mantendo enterrados desde o início da temporada, e a discussão se torna tão feia quanto deveria ser. Jimmy a acusa de não achá-lo bom o suficiente, e Kim o lembra de que sempre esteve ao seu lado quando ele precisou, arriscando sua reputação e sua carreira.
Olhando em perspectiva, a acalorada discussão dos dois, ao menos é um sinal de vida na relação do casal. Não faz muito tempo, Jimmy e Kim estavam tão apartados que não tinham sequer interesse em gritar um com o outro.
O rescaldo da ótima cena no estacionamento, com Jimmy fazendo as malas no apartamento de Kim, é igualmente genial em uma nota totalmente diferente. Apesar de tudo, ela ainda está ali por ele. E disposta a ajudá-lo.
Resta saber o que eles irão arriscar para conseguir.
Na semana que vem a temporada de Better Call Saul se encerra. Dez episódios passam voando quando uma série tem esse nível de qualidade. Vamos ver o que o season finale nos reserva.

"-Isso, pise no cara quando ele está na pior.
-Você está sempre na pior, Jimmy."

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