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segunda-feira, 18 de abril de 2011

(i)-Racional


A Mariúza entrou em casa feito um furacão. Bateu a porta da rua, jogou a bolsa no chão e andou batendo os delicados pés trinta e cinco no assoalho do apartamento. Parou com as mãos miúdas postadas desafiadoramente nos quadris arredondados, e soprou um fio de cabelo negro que se desprendera de seu rabo de cavalo caindo-lhe diante do olhos castanho. Estava diante da poltrona onde sentava Roberson, que olhava algum programa na TV e levou uma fração de segundo pra dizer "Oi, amor.", e mais outra para, de fato, olhar para Mariúza e perceber nela a cara de poucos amigos.
-Que foi, bem?
-Não me vem com "bem", não, Roberson de Souza Gomes. Não vem com "bem", não. Não depois do que tu fez?
Roberson olhou pros lados e então olhou de novo pra Mariúza:
-Quê?
-Quem é ela?
-"Ela" quem, meu amor?
-Rá, rá, rá.. "'ela' quem?", tu me pergunta... A tua amante, Roberson, a tua amante!!
-Quê?!
-É! Eu descobri! Tu pensou que podia esconder isso de mim, mas não! Eu descobri! Eu descobri, safado!
-Descobriu o quê, criatura? Eu não tenho nenhuma amante!
-Não tem amante? Não - Ela jogou um jornal nele. -tem -Ela jogou uma revista nele. - amante? - Ela jogou o porta revistas nele.
-Não! Não tenho! - Gritou Roberson se protegendo e esquivando dos improváveis projéteis.
-Não te faz de desentendido, não. Não pra cima de mim. Seja homem, admita o que tu andou fazendo, vai? Tenha hombridade uma vez na vida.
-Mas, meu amor, eu não sei do que tu t-
-Para, Roberson! Todo mundo já sabe! Ficaram me falando e eu, boba, não quis acreditar. Minha mãe bem que me avisou, tava sempre falando: "Não confia nesse Roberson, homem com furo no queixo não vale nada", mas eu não quis ouvir...
-Mas eu não tenho furo no queixo, mulher de Deus!
-Detalhes, detalhes! Tu acha que vai se safar com uma tecnicalidade, Roberson? Tu acha que não ter o furo no queixo, ou ter um furo metafísico no queixo vai te livrar de assumir a responsabilidade por aquelazinha? Acha?
-Mas que zinha! Mariúza? Que zinha? Eu não tenho amante! Eu nem flerto! Tu sabe que eu sou um desastre nisso!
-Sempre tem uma idiota que nem au pra cair na tua lábia!
-Que lábia, criatura? Eu nem falo!
-É, fica te fazendo de misterioso pra atrair as incautas! Miserável! - Ela jogou um livro nele.
-Peraí! Esse é o Guia do Mochileiro!
-Que se dane! Pegas as tuas coisas e some daqui! Pega teu Guia do Mochileiro da Galáxia, teu Senhor dos Anéis, e te some, vai lá ficar com aquela escrotinha de cabelo verde que é o que tu merece, tomara que ela não consiga fazer a cirurgia pra tirar aquele bico!
-Quê? Cabelo verde? Bico? Do que tu tá falando, Mariúza?
-A mulher que tava contigo naquela cafeteria onde se fazia download da comida via internet, ela tinha o cabelo tingido de verde e um bico de pato ao invés da boca, e tu ia dar dinheiro pra ela... Fazer... A plástica...
-...Tu sonhou isso?
-... NÃO! ... Bom... Pode ser. Talvez...
Ela deixou os braços caírem. Não era a primeira vez que aquilo acontecia. Roberson se levantou rindo e a abraçou.
-Que bobagem, meu amor. Vem cá.
A enlaçou com força, junto ao peito, ela correspondeu.
-Tá tudo bem. - Ele disse.
Ela suspirou e o abraçou de volta, mais tarde vasculharia o perfil dele no facebook procurando por gente de cabelo verde e bico de pato. Vai que fosse, sei lá, um presságio, né?

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