Pesquisar este blog

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Fronteiras


É sempre complexo ser confrontado com uma fronteira. Não se engane, não me refiro aqui, a limites geográficos territoriais. Me refiro a fronteiras algo diferentes, e que não são impossíveis de superar, mas uma vez cruzadas, não há retorno.
Todo o dia, á cada minuto, alguém esbarra com uma dessas fronteiras, e a vida dessa pessoa, depois de tal encontro, muda para sempre.
Foi o que aconteceu com o Laerte.
O Laerte tinha seus vinte e oito anos, ou, seja, estava longe de ser um sujeito velho. O Laerte tinha vinte e oito anos, frequentava a universidade, trabalhava, realizava atividades com seus amigos, jogava futebol, jogava cartas, ia ao cinema com pessoas de quem gostava muito, era um sujeito bastante tímido, mas nada que chegasse a atrapalhar a sua vida, embora já tivesse lhe custado algumas oportunidades de namoro vez por outra. Era, enfim, algo com o que Laerte podia conviver.
Laerte tinhna namorado apenas três vezes na vida, foram namoros sérios, que haviam durado bastante tempo (na própria opinião, pelo menos.), e com os quais Laerte aprendera muito sobre relacionamentos, especialmente que, ás vezes, é melhor ficar sem relacionamento algum.
Era o que Laerte vinha fazendo nos últimos anos, mantendo-se abstêmio de namoros, claro, havia tido relacionamentos fugazes, casuais, pois não era, afinal de contas, feito de ferro. Porém, ele estava solteiro, e assim se mantinha, pois isso dava-lhe tempo para tratar de coisas que, naquele momento, requeriam atenção da qual ele não poderia dispôr. O tempo passava e Laerte permanecia tranquilo, achava que, com vinte e oito anos, tinha tempo para se ocupar de relacionamentos mais tarde, afinal de contas, era jovem o bastante para dispôr de mais alguns anos de trabalho e estudo e adquirir alguma estabilidade antes de procurar alguém com quem dividir o tempo de forma mais definitiva.
Funcionava para Laerte. Até que, em um dia como qualquer outro, aconteceu.
Era um sábado frio e julho, e Laerte saiu do trabalho sob forte chuva. Foi até a locadora devolver o filme que havia pego na noite anterior e, quem sabe, apanhar mais um ou dois, afinal, o final de semana aquático não prometia lá muito mais do que tempo para assistir filmes que haviam lhe escapado no cinema.
Laerte apanhou mais um par de filmes e, ao chegar no balcão, deparou-se com uma atendente nova. No boton que ela portava na camiseta lia-se: Jéssica, e, logo abaixo, em treinamento".
Ela era morena, bonita, e tinha um audacioso piercing no nariz.
Laerte não queria casar com ela, não queria namorar com ela, não queria nem sequer dar-lhe uns beijos no cantinho da locadora, mas pensou em flertar um pouco, afinal, era divertido e exercitava sua habilidade de interação social.
Ela perguntou o número da ficha, e o nome do titular, ele passou os dados, sorrindo.
Ela tirou a nota, estendeu para que ele assinasse, empacotou os filmes e disse:
-Fica pra segunda-feira, do meio-dia ás vinte e duas horas, óquei?
Ele, com um sorriso amigável, assentiu dizendo:
-Jóinha.
Apanhou a sacola e acenou dizendo "tchau, Jéssica.", e ela respondeu dizendo "Bom dia, tio.".
Ele virou rápido, algo chocado, não pôde evitar:
-Quê?
-Bom dia, senhor.
-Ah.
Era tarde. Talvez tivesse sido por culpa do "jóinha", talvez fosse a barba por fazer, ou os óculos, ou até as olheiras por conta das noites em claro no decorrer da semana, mas a questão é que aquele "tio", agora, estava preso em Laerte, fazendo-o se sentir velho, cansado, preparado para dizer coisas como "no meu tempo", e "Quando eu era guri", mas, pior de tudo, fez Laerte se deseperar por ser um sujeito sozinho.
Laerte cruzara uma fronteira sem volta. Ele havia ficado para titio.

2 comentários:

  1. PQP e ele achando que ainda dava um caldinho hein?

    * ps: ai no Sul vocês utilizam dessa gíria? Caldinho?

    ResponderExcluir