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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Lembra?


Lembra quando a gente era piá?
As tardes á toa, em pleno inverno, todo mundo abraçado nos joelhos falando bobagem na escada do prédio, se escondendo da chuva?
Lembra daquela época em que a única obrigação era ir à escola, e o resto do dia era uma festa?
Lembra de ir pra escola com a mochila cheia de gibi pra emprestar pro colega que também te emprestava os gibis dele?
Lembra de como eles nem sempre voltavam, ou levavam uma vida pra voltar, mas tu não tava nem aí, pois teu tesão era pelo usufruto e não pela posse?
Lembra de quando era um evento pra gurizada quando alguém da rua tinha comprado uma bola nova? Da tensão pra estrear a tal bola nova no Marinha?
Lembra daquela época em que bom, mas bom mesmo, era passe de calcanhar que dava certo? E a gente tentava dar passe de calcanhar. Á ponto de o resto do time gritar que, se de frente o sujeito já não sabia fazer um passe, imagina de costas?
Mas daí, em um momento, o tal do passe de calcanhar dava certo, bola no pé do atacante, e ele guardava, e vinha na tua direção e vocês se cumprimentavam, e tudo estava bem, e tu, todo pimpão pelo passe genial, começava a jogar cheio de vontade, disputando todas as divididas como se fosse a última...
Lembra de ir ao cinema "de galera"? Oito guris bebendo Fanta laranja morna no gargalo da garrafa de dois litros? Lembra que ninguém ficou gripado naquele ano? Anti-corpos, de certo.
Lembra de quando a segunda melhor hora do dia era 10:15 da manhã, que era hora do recreio? E aí a gente saía correndo pro bar pra pegar um guaraná, e ficava conversando sobre o filme da noite anterior, ou sobre como a prova de antes do recreio tinha sido chata, ou chutando latinha pelo pátio?
Nessa época a melhor hora do dia era 12:15, que era hora da saída. E a gente corria feito uma manada de animais selvagens ao soar da campainha em direção à rua, e não raro, o mais veloz, que tinha chegado primeiro no portão, era abalrroado pelos demais, e gritava quando o impacto da multidão à suas costas batia sua cabeça no cadeado, e todo mundo ficava ali, espremido, esperando que o porteiro, afinal, nos oferecesse a "carta de alforria" que almejávamos desde as oito da manhã.
Lembra de tirar as calças no meio da aula de inglês, que era o último período antes da educação física, por que tu não queria perder precioso minutos de futebol trocando de roupa no banheiro e ia se adiantando, pra escândalo da professora?
Quando o dia mais glorioso da semana era a quinta? Pois a quinta era véspera de sexta, e sexta, depois do recreio já era final de semana.
Lembra de quando tu percebeu que a Danielle ficava te olhando jogar bola e cochichava com as amigas quando tu olhava, e aquela perspectiva era, ao mesmo tempo, excitante e apavorante, por que tu queria muito fazer tudo com ela, mas não tinha lá muita certeza de o que era "tudo"?
Lembra do primeiro beijo? Em um canto obscuro da escada, escorado na parede com ela dois degraus acima pra equiparar a altura, chupando um Halls de cereja que ficou na tua boca depois do beijo, e de ti, um tremendo mané, super orgulhoso da própria presença de espírito quando disse que precisava devolver a bala dela, pedindo outro beijo?
Lembra quando tu tinha que escolher entre ir dar uns amassos com a Dani atrás do museu ou sair correndo logo pra casa, pra almoçar antes de ir pro parque jogar futebol ás quatro, no máximo?
Lembra como alguns de nós tinham pressa em crescer?
Lembra que tu percebeu que, talvez, estivesse crescendo quando dar uns malhos começou a ficar mais divertido do que jogar bola?
Lembra do primeiro coração partido?
Da primeira briga?
Lembra do primeiro porre, que nem foi teu, mas de um amigo teu, e todo mundo achou que ele fosse morrer ou entrar em coma?
Lembra como, na época, tudo parecia acontecer tão rápido, e hoje tu vê que aqueles anos levaram, de fato, anos pra passar, e hoje em dia, sim, tudo é rápido demais e tu não consegue tempo pra fazer tudo o que tu gosta, e tu fica indignado com a molecada de hoje, que desperdiça tudo de bom que a infância e o início da adolescência têm, pulando essa fase e agindo como adultos em miniatura?
Pois é... Por isso eu ainda seguro com firmeza a mão daquele guri bobo e meio sem noção de anos atrás.
Por que hoje nós temos milhares de reponsabilidades, e a maioria de nós, em algum momento, se sente um pouco escravo delas, e percebe que isso é normal, afinal, de contas.
Bom, quando isso me acontece, eu vou ao cinema e bebo Fanta, ou leio um gibi, ou cutuco a bola de calcanhar no futebol de sexta-feira, é uma maneira de manter aquele piá por perto, aproveitar o gostinho daquela época e lembrar que o caminho até aqui foi deveras saboroso, e que eu não mudaria uma vírgula do que fiz.

4 comentários:

  1. Eu lembro Rodrigo.
    ótimo texto de hoje, com certeza vou ficar nostálgica o resto do dia.
    Já falei sobre isso aqui http://avidaeumaopera.blogspot.com/2009/10/epoca.html
    e aqui http://avidaeumaopera.blogspot.com/2009/08/retrato.html

    ps: quinta feira depois das 17 hs ainda é um dia muito glorioso rs, tem coisas que não mudam :)

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  2. Pôxa, a gente não é jovem demais pra esse tipo de reminiscência?
    Ainda bem que ainda existe a quinta depois das cinco, viu?

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  3. Concordo, Capitão! Eu jamais mudaria uma vírgula se quer da minha adolescência. Tudo cooperou para que eu tivesse as melhores lembranças.
    Agora, em seu comentário, será que não somo jovens para esse tipo de memória? Não é questão de juventude, mas de aplicação dessa memória, fazer determinadas atividades para deixar vivo os melhores momentos!!!

    Quando chega quinta-feira, as 17h e 25min, tenho certea do meu final de semana!!! Também pego a minha fanta, assisto um filme e as coisas ficam mais tranquilas...

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  4. porra, cortei os pulsos com a bolacha maria molhada no leite agora guri! ótimo texto, mas me deixou muito melancólicoa...

    bj bj

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