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quarta-feira, 15 de maio de 2013

Beauty School Drop-Out



Andava pelo shopping com a sacola debaixo do braço. Deu-se conta que tinha consigo a sua mochila, então, tirou-a das costas, agachou-se e abriu o zíper duplo, jogando o saco plástico com as revistas lá dentro. Enquanto voltava a fechar a mochila, a alça pela qual segurava a peça escapou-lhe entre os dedos e caiu pesadamente no chão. Um bolso cheio de inúteis canetas estava mal fechado, e com o impacto no assoalho do shopping, algumas escapuliram do bolso. Não muitas. Três ou quatro, saltaram e rolaram. Ele as foi apanhando enquanto rolavam, não alheio ao ridículo de um homem adulto correndo encurvado atrás de canetas coloridas pelo shopping center, ou ao que pensariam os seguranças vendo um sujeito derrubando canetas avulsas dos bolsos da mochila após acabar de sair de uma livraria.
Uma das canetas, mais rebelde, rolou vertiginosamente pelo chão, detendo-se aos pés de uma moça que passava.
Moça, não. Mocinha.
Além de miudinha, ela era jovem. Não devia ter mais do que quinze, dezesseis anos. Ela agilmente pousou o pé dentro de um tênis surrado sobre a caneta, juntou-a e entregou na mão dele, que sorriu agradecendo.
A menina, que não era particularmente bonita, chamou-lhe a atenção por duas coisas:
O cheiro do perfume, dolorosamente familiar, doce, com cheiro de alguma coisa que dá vontade de comer, mas no bom sentido, e pelo cabelo.
Um tenebroso rosa brilhante, muito claro. Quase como uma peruca de algodão-doce. Outra coisa que queremos comer no bom sentido.
Enquanto a menina sorria de volta, e retomava seu caminho, ele ficou olhando pra ela e foi assaltado pela memória que aquele perfume lhe trazia. Então, esforçou-se para lembrar com quem aquele cabelo deixara a menina parecida... Uma personagem de filme...
A Frenchy! Lembrou-se.
A menina que larga a escola e tenta virar esteticista em Grease - Nos Tempos da Brilhantina. Ela adormecia na lanchonete onde os amigos tomavam milk shakes e comiam hambúrgueres e batatas fritas enquanto flertavam e planejavam vingança contra as gangues rivais e era interpelada por um anjo vivido por Frankie Avalon, que a aconselhava a voltar pra escola...
Ele lembrou-se de que, em praticamente todas as vezes em que assistira a Grease, entendia o refrão da canção do tal anjo como alguma coisa parecida com "plurisnodraba".
Inclusive cantarolava, embromando "Plurisnodraba, parã, no gradueichon dei fór iú..." logo após o número musical terminar.
E assim foi por anos, até que, numa madrugada assistindo ao filme com seu irmão, e rindo do fato de todos aqueles estudantes do secundário parecerem sujeitos na casa dos trinta e tantos anos, ouviu Frankie Avalon cantando para a Didi Conn, e quase de relance, entendeu que não era, obviamente, "plurisnoudraba", que o "teen angel" cantarolava para a "ex-teticista" Frenchy. Era "Beauty School Drop-out".
De repente toda a canção e o contexto começaram a fazer sentido, e ele passou a curtir mais a canção quando a cantarolava, por alguns minutos após ouvi-la no filme.
Era, pensou, um momento de iluminação rasteiro, uma epifania, se é que podia ser chamada assim, suburbana, se tanto, mas ainda assim, foi uma descoberta. Tardia, mas uma descoberta.
E pensando em descobertas, e com aquele perfume tão familiar ainda em suas narinas, e muito em seu coração e mente, lembrou-se de outro momento de iluminação... De outra epifania, que nada tinha de suburbana ou de rasteira:
Ele encontrara o amor de sua vida. E vivera o amor de sua vida.
Todo o resto, dali em diante, seria tão supérfluo quanto canetas coloridas, ou cabelos tingidos de cor de rosa.

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